segunda-feira, 23 de maio de 2011

Represa de Itupararanga e Pedreira de Salto de Pirapora – 21 de maio de 2011


Eu estive aqui, mas já não estou mais. Estou à beira de uma represa, de uma mata ou de uma estrada, nesta última admirando o clarão vermelho que toma um pedaço do céu emprestado por um breve momento no findar da tarde. Esta é a minha forma de pôr à prova a teoria materialista-dialética de Karl Marx de que o meio ambiente determina a consciência humana. Não quero e não procuro ensejos para mudar o mundo. Quero que o mundo me transforme.
Eu, Luiz Paulo e Thiago
Uma manhã de sábado, em meio à multidão, num centro de compras em que o consumismo realmente “consome” os seres: cenário perfeito para a concepção de uma ideia libertária. Eu e Luiz Paulo Blanes, sem perspectivas para o restante do dia, resolvemos convidar alguns amigos para uma incursão de moto enquanto éramos assolados pela claustrofóbica inquietude do centro comercial de Americana. Algumas ligações, breves argumentações e tudo estava resolvido. Não é preciso muito esforço para tirar do ócio cidadãos que apenas conhecem o mundo pelas projeções de um televisor. Eu, Luiz Paulo Blanes, Anna Carolina Oliveira, Kayk e Thiago Lucas Santos partiríamos dali. O destino seria Salto de Pirapora, uma cidade que já conhecia de outras datas. Nos arredores da cidade, contudo, havia uma pedreira desativada recentemente transformada em lagoa. Ela eu não conhecia.
A monocultura da cana
Deixando a Praia Azul, nosso ponto de encontro em Americana, rapidamente adentramos a SP-304. Nesta permanecemos até o acesso ao bairro de Santo Antônio do Sapezeiro, em Santa Bárbara d'Oeste. A Rodovia Comendador Américo Emílio Romi, ramificada deste acesso, seria o nosso atalho para a Rodovia do Açúcar e a Santos Dummont, conhecidas estradas que nos transportariam ao local que possivelmente testemunharia nossa libertação. Por todas estas estradas a monocultura da cana-de-açúcar mostrava a sua força. Era como se a paisagem não se modificasse, mesmo estando em três rodovias diferentes. Na Raposo Tavares o panorama se modificou um pouco, pois agora as grandes edificações de Sorocaba preenchiam nossas vistas. Foi analisando todo esse concreto que adentramos a cidade de Votorantim, pretendendo atravessá-la pra alcançar uma rotatória que nos levaria à já citada pedreira em Salto de Pirapora.

Rodovia do Açúcar

Estrada para Ituparanga
Planos só trazem decepções. Não quero ir para cá ou para lá apenas porque em algum momento eu disse que o faria. Gosto de ter liberdade de escolha e de mudar roteiros tão logo eu sinta vontade para tal. Então, mais uma vez, aproveitei-me desta minha característica para modificar o trajeto da viagem. Avistei placas, ainda na entrada da cidade de Votorantim, apontando para a Represa de Itupararanga. Poderíamos ir até ela, retornarmos e, caso tivéssemos algum tempo sobrando, levaríamos a cabo o plano original. No fim das contas, conhecer a Represa de Itupararanga se tornou nosso escopo. Logo eivei meus parceiros com a ideia e nos dirigimos para lá. O principal ponto positivo desta nova abordagem foi que, por incrível que pareça, não necessitaríamos atravessar o centro comercial de Votorantim e toda a sua eloquência. Havíamos escapado do de Americana. Não intentávamos cair em outro.
Represa de Itupararanga
A estrada que leva à represa é cheia de curvas, bosques e belas paisagens. Surpreendemo-nos com a existência deste lugar dentro do território de Votorantim, cidade praticamente toda urbanizada e dependente das empresas de Antônio Ermírio de Moraes. Ao chegar a Itupararanga, a visão ficou ainda mais agradecida pela beleza do local. Águas límpidas, pequenas “praias” e uma barragem que lembra o coliseu. Infelizmente a segurança no local é reforçada e sequer pudemos molhar as mãos na represa. Tiramos fotografias de todos os ângulos possíveis e seguimos pela garbosa estrada, que atravessa a barragem. Informaram-nos que a mesma culminaria em Piedade, e foi o que aconteceu.

A barragem da Usina Hidrelétrica de Itupararanga

Reservatório de 936km²
Uma breve nota: a represa de Itupararanga, construída em 1911, foi idealizada no cânion do Rio Sorocaba, na Serra de São Francisco, com o intuito de atender as demandas de energia elétrica das empresas do Grupo Votorantim e das cidades de Ibiúna, São Roque, Sorocaba e Votorantim. A usina foi inaugurada em 1914. Segundo a Wikipédia, “possui um lago com canal principal de 26km de extensão e 192km de margens, em uma área de 936km²”. Está inserida dentro de uma Área de Proteção Ambiental e é fiscalizada pela S.O.S Itupararanga. Tomara que todos os esforços sejam em prol de garantir, além da beleza, a aparente limpeza da represa. Não se pode reproduzir os mesmos erros cometidos em represas como a Billings e a Guarapiranga, ambas em São Paulo, e torná-la um imenso reservatório de água poluída.
Pedreira de Salto de Pirapora
Ao chegarmos a Piedade, abastecemos as motocicletas e retornamos para Salto de Pirapora. Com a noite e o frio por vir, rapidamente passamos pela Cimento Votoram e entramos em uma curta estrada de terra para alcançarmos uma área de extração de calcário. Nela, uma pedreira desativada abriga um lago de águas verdes. A Pedreira de Salto de Pirapora, como ficou conhecida, é fruto de uma perfuração profunda que acabou atingindo o lençol freático, inundando o local e, por incrível que pareça, transformando uma cratera de pedras em um cartão-postal interessante. Escolas de mergulho utilizam estas águas, que em alguns locais chega a ter 80 metros de profundidade. Escalei uma encosta pedregosa para obter um ângulo melhor para as fotografias e, ao tentar descer, desgarrei-me e por pouco não fui jogado para as águas da pedreira. Seria uma queda de mais de 10 metros que, somada a minha ineficaz técnica de natação, poderia acarretar uma calamidade. Por sorte consegui me amparar nas raízes de algumas plantas que brotam em meio às pedras. Já foram registradas algumas mortes por aqui e, aliviado, não me incluí nas estatísticas.

O regresso, ao cair da noite

Perto das dezoito horas partimos de lá. Ficou evidente para mim, depois de 330km rodados, que a ação humana pode conceber, indiretamente (caso da pedreira) ou com fins lucrativos (caso de Itupararanga), algo digno de ser conhecido. Temos manipulado a natureza desde o alvorecer da humanidade, e o impacto dessa manipulação cresce exponencialmente com o passar dos séculos. É preciso repensar nossa conduta, e é papel de todos, inclusive o meu, delatar ou aplaudir tudo o que tem sido feito com o nosso rico meio ambiente. Para isso, é preciso viajar e conhecer a realidade. Então, viaje. Conheça. Veja, mas não passivamente. Deixe o mundo te transformar e, então, impeça que ele seja transformado desmedidamente.


Mais fotos aqui.

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