Depois de uma grande decepção (as pessoas nos decepcionam ou a decepção nos é intrínseca?), nada melhor e revitalizante do que viajar de motocicleta em excelentes companhias. Eu e Fernando Carcará “Bandit”, com isso em mente, e coroando a “apoteose motociclística” de Anna “Bebê” Carcará e Rose “Jiraya” Carcará, levamos a cabo mais uma grande empreitada. A jornada, desta vez, consistia em sair de Santos/SP e chegar ao Rio de Janeiro/RJ margeando o Oceano Atlântico pela rodovia Rio-Santos (BR-101? SP-55? Estradas sem história. Este é o Brasil!).
Igreja de São Benedito, em Santos/SP |
Trindade/RJ |
Em Angra fui bombardeado por uma mescla de sensações, e não pelos canhões da Marinha Brasileira que descansam inertes por entre os balaustres na orla da avenida principal. A cidade em si não é tão aprazível, e as praias próximas ao centro são sujas e malcheirosas. Nas fotos o local parece mais bonito do que realmente é. Caminhando em direção ao Colégio Naval experimentei nuances muitas vezes antagônicas de sentimentos. A água transparente contrastava com os dejetos sobre as pedras. Os passeios mais contundentes ali são aqueles feitos a barco, e infelizmente não tivemos tempo hábil para tal luxo.
O fim de tarde de Angra é inenarrável. No caminho de volta para a pousada, eu e “Bebê” presenciamos uma das cenas mais impressionantes de nossas aventureiras existências: o sol, que murchava atrás dos morros posteriores à Escola Naval, aquarelava os céus de uma tal maneira que fui obrigado a fotografar várias vezes, e do mesmo ângulo, para ter certeza absoluta de que aquilo se tratava de um fenômeno real. Pude distinguir o violeta, o amarelo, o laranja e o vermelho no horizonte, todos dividindo o mesmo firmamento. Há quem diga, olhando atentamente às fotos, que mais cores pontilham a paisagem. Enfim, vejam por vocês mesmos.
Como dito em uma outra oportunidade, muitas das coisas que vemos nos marcam para sempre, sejam positiva ou negativamente. Nesta jornada, dos quatro dias em que os quatro pneus se relacionaram intimamente com o asfalto da 101, talvez apenas alguns minutos tenham sido realmente transcendentais. Pude admirar as belezas naturais do nosso litoral, e também rir ironicamente com a rudez de certas pessoas que certamente andam duelando psicologicamente consigo mesmas. Meu ímpeto de querer ver, descobrir e de aventurar-me, no fim das contas, foi até mesmo maior que o lastimável preço da gasolina brasileira e dos pedágios da Dutra.
Que na apostila do viajante e do aventureiro, que é material indispensável para a formação na escola da vida, essas três lições sejam compulsoriamente transmitidas como conteúdo indispensável para a formação do ser humano (todos os pleonasmos aqui são justificáveis e perdoáveis, dada a emoção dos momentos):
1) Visualização estática do clarão vermelho do findar de tarde e do clarão alaranjado do amanhecer de Trindade/RJ;
2) Apreciação boquiaberta da pintura que o artista sol apresenta na galeria de artes sobre a Escola Naval de Angra/RJ (em suma, como diria Renato Russo, a Angra é dos reis!);
3) Passagem lenta e atenta pelos caminhos da RJ-155, principalmente por entre os três túneis escavados rusticamente em meio aos morros úmidos da Serra do Mar.
Foram 1400km virando a mesa e metendo o Marlon Brando nas ideias. E que a próxima expedição não tarde a acontecer.
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